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Considerações sobre a Lei de Estágio



Publicado em: 30 de abril de 1984

A Lei n.º 11.788/2008 regulamenta as atividades de estágio realizadas por estudantes de todos os níveis de formação. O presente texto, entre outros, tece comentários sobre a importância desse dispositivo e analisa as implicações decorrentes, no que concerne aos cursos de graduação em Psicologia. O Art. 1.º da Lei 11.788/2008 assim define o estágio: Estágio é o ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de educação profissional de ensino médio, da educação especial e dos anos finais de ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de jovens e adultos.

A Lei aponta para o papel que a agência educativa deverá desempenhar no conjunto das atividades e no seu gerenciamento, seja nos estágios de caráter obrigatório, definido como tal no projeto de curso, ou nos estágios de caráter não obrigatório. Os estágios de caráter obrigatório nos cursos de formação de psicólogos podem ser realizados internamente, dentro das dependências da agência formadora, ou externamente, em diferentes contextos: hospitais, clínicas, escolas, empresas, mediante celebração de um termo de compromisso entre educando, parte concedente do estágio e instituição de ensino.

O estágio não obrigatório, opcional, será válido como complementar à formação, desde que cumpra os mesmos requisitos dispostos no Art. 3º. A ação de professores, orientadores e supervisores deverá ser prevista em qualquer das modalidades de estágio. É importante apontar o descrito no parágrafo 1º, do Art. 3º da Lei 11.788/2008: O estágio como ato educativo escolar deverá ter acompanhamento efetivo pelo professor orientador da instituição de ensino, e por supervisor da parte concedente, comprovado por vistos nos relatórios referidos no inciso IV do caput do art. 7º desta Lei e por menção de aprovação final.

A nova Lei presume um envolvimento maior de ambas as instituições, tanto nos estágios obrigatórios quanto nos não obrigatórios. A Lei inova ao prever o acompanhamento pelo professor orientador da instituição de ensino, comprovado por vistos nos relatórios de estágio. Na perspectiva de garantir ao estudante o exercício efetivo de atividades compatíveis com sua área de formação na situação de estágio, entendemos que esta exigência é um dos pilares da Lei, a saber, a participação direta e efetiva da ação educativa na avaliação da atividade laboral que
caracteriza o estágio. As expressões “treinamento em serviço” ou “aprender fazendo” estão implícitas no texto da Lei, indicando que a experiência profissional proporcionada pelo estágio será tanto mais enriquecedora quanto mais envolvida por uma ação educativa.

Frequentemente registram-se reclamações e denúncias referentes a jovens estagiários que são equivocadamente submetidos a tarefas totalmente desvinculadas da atividade profissional em questão. A ação da instituição escolar junto às organizações concedentes é um dispositivo importante para que a interação entre elas resulte na melhor qualidade do estágio.

Eventuais ajustes poderão ser necessários ao cumprimento da Lei, principalmente no que concerne à relação entre orientadores e supervisores da agência formadora e da parte concedente. Recomendamos que seja garantida a comunicação entre ambos, antes mesmo do início do estágio. O importante é que o curso e a parte concedente garantam que haja aderência dos orientadores e supervisores à área do estágio. Este espaço deverá ser preenchido mediante negociação entre as partes, visando à qualidade do estágio.

A esse respeito, destacamos: Art. 7º - São obrigações das instituições de ensino, em relação aos estágios de seus educandos
(...)
III – indicar professor orientador, da área a ser desenvolvida no estágio, como responsável pelo acompanhamento e avaliação das atividades do estagiário. Art. 9º - As pessoas jurídicas de direito privado e os órgãos da administração direta, autárquica e fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como profissionais liberais de nível superior devidamente registrados em seus respectivos conselhos de fiscalização profissional podem oferecer estágio, observadas as seguintes obrigações:
(...)
III – indicar funcionários de seu quadro de pessoal, com formação ou experiência profissional na área de conhecimento desenvolvida no curso do estagiário, para orientar e supervisionar até 10 (dez) estagiários simultaneamente. A inserção em equipes multiprofissionais e interdisciplinares possibilita aos estudantes diversas experiências em orientação e supervisão. No campo da saúde, os estudantes poderão fazer parte de equipes coordenadas em rodízio por orientadores e supervisores de diferentes profissões, desde que pertençam à mesma área de conhecimento, o que frequentemente ocorre em Saúde Mental. No campo da Educação, é usual existirem equipes supervisionadas por técnicos de áreas afins que compartilham preocupações formativas comuns. Do mesmo modo, podem ocorrer orientações e supervisões em equipes nos campos das organizações e trabalho, esporte, assistência social e judiciário, entre outros. Recomendamos fortemente que o orientador da instituição de ensino seja psicólogo com inscrição ativa no CRP de sua região. É importante lembrar que as diretrizes curriculares propõem: Art. 5º - A formação em Psicologia exige que a proposta do curso articule os conhecimentos, habilidades e competências em torno dos seguintes eixos estruturantes:
(...)
e) Interfaces com campos afins do conhecimento para demarcar a natureza e a especificidade do fenômeno psicológico e percebê-lo em sua interação com fenômenos biológicos, humanos e sociais, assegurando uma compreensão integral e contextualizada dos fenômenos e processos psicológicos; f) Práticas profissionais voltadas para assegurar um núcleo básico de competências que permitam a atuação profissional e a inserção do graduado em diferentes contextos institucionais e sociais, de forma articulada com profissionais de áreas afins. A Lei n.º 11.788/2008 cumpre papel fiscalizador das relações entre instituições de ensino, estudantes e concedentes de estágios, entendendo-as como parte do processo formativo. O curso que celebrar convênios, portanto, precisará estar atento às condições de oferta do estágio, e alerta no sentido de evitar o desvirtuamento da noção de treinamento. A construção de diálogo eticamente orientado contribuirá para aparar eventuais arestas de parte a parte. Esperamos que as instituições de ensino e as partes concedentes consigam construir acordos e entabular negociações no sentido de viabilizar a oferta de estágios para graduandos, dentro de um projeto maior de formação de recursos humanos. Neste aspecto destacamos os Princípios Fundamentais I, II e VI do Código de Ética Profissional do Psicólogo: I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos. II. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
(...)
VI. O psicólogo zelará para que o exercício profissional seja efetuado com dignidade, rejeitando situações em que a Psicologia esteja sendo aviltada. O estudante busca experiência, a parte concedente do estágio deseja e precisa recebê-lo para dar continuidade à formação de recursos humanos e as instituições de ensino necessitam dos espaços para o treinamento de seus alunos. A educação é um dos pilares para o desenvolvimento do País. Por isso, esperase que os esforços de todos os envolvidos caminhem na direção da crescente qualificação da formação dos psicólogos.