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20 de julho: aniversário de Frantz Fanon


Publicado em: 19 de julho de 2019

Frantz Omar Fanon nasceu em 20 de julho de 1925, em Fort-de-France, na Martinica, em um meio abastado. Sua mãe era de origem alsaciana, o que explica a escolha do seu nome, e seu pai trabalhava para a administração colonial. Filho de um casal de “sangue misturado”, foi marcado, além disso, pelo fato de que era o mais escuro dos oito filhos da família. Ser o mais escuro, diria ele depois, era “ser o menos branco”. Assim, não é surpreendente que tivesse se preocupado, durante toda a vida, com a questão Branco/Negro.

Entre 1939 e 1943, estudou no Liceu Schoelcher, onde o poeta Aimé Césaire ensinava. Depois, hostil à política do marechal Pétain, foi para Domínica, para alistar-se nas Forças Francesas Livres da região caraíba. No ano seguinte, aos 19 anos, combateu na frente europeia e descobriu, nas fileiras do exército de libertação, que a França resistente não era menos racista do que a França pétainista e antissemita. Foi enviado à Argélia e depois condecorado com a cruz de guerra pelo general Raoul Salan, comandante em chefe do 6º regimento de atiradores senegaleses.

Em 1947, graças a uma bolsa do governo, inscreveu-se na faculdade de medicina de Lyon e se especializou em psiquiatria. Foi então que iniciou a redação da sua tese, “Pele negra, máscaras brancas”, publicada em 1952, no ano em que se encontrava no Hospital de Saint-Alban. Ali, formado por François Tosquelles, integrou-se à grande corrente da psicoterapia institucional, nascida na França com a luta antinazista. Antifreudiano, recusou-se a fazer análise e, em dezembro de 1953, Fanon se casa com Josie e é nomeado médico-chefe do Hospital de Blida, na Argélia, onde passaria três anos tratando dos doentes mentais, no contexto da guerra de libertação nacional.

“Pele negra, máscaras brancas” era uma resposta à “Psicologia da Colonização”, obra do psicanalista francês Octave Mannoni, publicada em 1950. Mesmo julgando sincero o procedimento de seu adversário, Fanon o acusava de psicologizar a situação colonial e reduzir os conflitos entre o homem branco e o homem negro a um jogo sofisticado, que levava a manter o colonizado na dependência do colonizador. Era uma crítica de peso e, depois dessa polêmica, Mannoni manteve com o seu próprio livro uma relação ambivalente, ora renegando algumas de suas teses, ora defendendo-as.

Se Mannoni, antes mesmo de se tornar freudiano, defendia posições universalistas, corrigidas pela fenomenologia, Fanon, recusando o freudismo, adotava o princípio de um culturalismo cimentado pelo engajamento anticolonial. Era por isso que descartava a psicanálise, por causa de sua suposta incapacidade de levar em conta a negritude ou a identidade negra: “Nem Freud, nem Adler, nem mesmo o cósmico Jung pensaram nos negros em suas pesquisas [...]. Queiram ou não, não é hoje nem amanhã que o complexo de Édipo nascerá entre os negros.”

Entretanto, para construir sua teoria da identidade negra, baseava-se na noção de estádio do espelho de Jacques Lacan. Ela lhe permitia criticar a psiquiatria colonial, fundada em uma classificação “racista”, e distinguir a abordagem culturalista da subjetividade da psicologia dos povos e do diferencialismo.  Na mesma medida em que Mannoni se ligava a uma psicologia que o conduzia a considerar a situação colonial como um jogo de papéis ou uma brincadeira perversa, Fanon utilizava os conhecimentos da psicanálise para rejeitar o freudismo em nome de uma política.  Nisso, ele antecipava as posições da antipsiquiatria.

Próximo da Frente de Libertação Nacional (FLN), da qual se tornaria membro em 1957, Fanon demitiu-se de seu posto de médico-chefe em 1956 para ir para Tunis e empenhar-se ainda mais no combate. Ensinou na faculdade de medicina, praticou a psiquiatria no Hospital de Manouba, e depois, com Charles Géronimi, abriu um serviço diurno. Continuou também a escrever.

Em 1960, quando redigiu o seu grande livro, “Os condenados da terra”, o mais belo manifesto da revolta anticolonial, ficou sabendo que estava leucêmico. Morreu em 6 de dezembro de 1961, em um hospital de Washington, convencido do caráter inevitável da independência, pela qual tanto lutara.

Apaixonadamente lida e comentada no mundo inteiro, a obra de Fanon foi mitificada nos Estados Unidos, onde o autor, com a auréola de herói da negritude, foi transformado nos anos 1990, pela sua referência ao estádio do espelho, em um “Lacan negro”, mais psicanalista do que psiquiatra, e, principalmente, teórico da hibridização cultural, isto é, de uma não diferenciação entre a identidade negra e a identidade branca. Apesarde sua importância para a compreensão das relações raciais contemporâneas, suas obras ainda são pouco estudadas no Brasil.


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